Esta postagem é a 2ª Avaliação de Mediciana Legal I cuja nota é 10.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Faculdade de Direito
Disciplina: Medicina Legal I - 2022.1
Prof. Nelson Massini
Aluno: Wagner Azevedo Pereira Matr. 201620555811
SÍNDROME
DA CRIANÇA MALTRATADA/ESPANCADA
Introdução
Este
trabalho tem o objetivo de mostrar que a criança sofre maus tratos
ao longo da História a Humanidade. Alguns registros chegaram até
nós, mas com certeza muitas barbaridades permanecem desconhecidas
ou estão ocultas. Hoje temos mecanismos jurídicos para inibir as
atrocidades e covardias contra elas e devemos cada um de nós ficar
atentos para alertar a sociedade, a todos os que trabalham com
crianças e principalmente os médicos que as atendem em
pronto-socorro, a partir da suspeita, que se faça denúncia aos
órgãos responsáveis, sob pena de responsabilidade de omissão; os
possíveis agressores devem ser investigados e, com a confirmação,
punidos. Conceituremos essa problemática, a importância do
médico-legal nos casos e como eles podem ser constatados.
Conceito
A
síndrome da criança maltratada/espancada é
caracterizada quando a criança é vítima de deliberado trauma
físico provocado por uma ou outras pessoas responsáveis por seu
cuidado.
Somente
em São Paulo aproximadamente 750 crianças sofreram violência por
hora em, dentro de casa, 110 foram vitimadas
por espancamento e morreram, no ano de
1994, segundo o médico Uchôa.
E nos EUA o
número é bem maior: cerca de 10.000
crianças nessa situação e que a incidência tende a aumentar,
segundo a Associação
Humanitária Americana em trabalhos realizados por Rheingold. A
faixa etária de 55% das vítimas
apresentam idade inferior a 4 anos. Em
75% dos casos são apontados os pais
isoladamente ou em conjunto por essa
tragédia, em estudos conduzidos por
Kempe. Com relação às circunstâncias,
as crianças apresentavam quadro de
lesões diversas: injúrias,
golpes diversos, traumatismos,
sendo que em 25% casos levaram-nos à
morte.
Síndrome
de Caffey-Silverman
A
Síndrome de Caffey-Silverman
ou hiperostose
cortical infantil é uma lesão clínica-patológica incomum de
etiologia desconhecida e histogênese incerta (Stiller, D. Zentralabl
Allg Pathol 1990; 136(1-2): 151-69), mas
foi sugerido que a hiperostose cortical
infantil pode ser uma osteogisgenia embrionária consequente
a um defeito local do suprimento sanguíneo
da área. Há outras teorias, como a
propôs se tratar
de um defeito hereditário das arteríolas que suprem a partes
afetadas,
resultando em hipóxia que produz necrose focal dos tecidos moles
suprajacentes e proliferação do periósteo. E
ainda sugerem que
seja um padrão hereditário, com
caráter autossômico dominante com penetrância incompleta.
Clinicamente, a doença evidencia-se por
desenvolvimento de tumefações
sensíveis dos tecidos moles, de forma
profunda, e espessamento cortical ou
hiperostose que envolve alguns ossos.
Ela surge comumente nos
três primeiros anos de vida e amiúde
os ossos afetados são a mandíbula e as
clavículas. Entretanto, essa síndrome
da criança espancada foi reconhecida por Tardieu, em
1960, como entidade clínica e
foi Caffey quem a relatou em 1946 os
primeiros 6 casos de fraturas múltiplas de ossos longos associadas a
hematoma subdural crônico. Alguns
anos após, Silverman relatou caso semelhante definido claramente
como lesão traumática. A expressão
síndrome da criança espancada foi
utilizada pela primeira vez em 1962 por
Kempe e col. Eles
recebiam um grande número de crianças vítimas de traumas de origem
desconhecida pela história clínica e ficaram alarmados. Salienta-se
que existem diversas
maneiras de agressão nessa síndrome:
na maioria das vezes os agressores são
os próprios pais; outras, por terceiros
(menores de idade, deficientes mentais e babás mal preparadas) que
tomam conta dessas crianças.
A
importância do médico-legal
É
de extrema importância o papel do médico no combate a esse problema
e veremos como proceder diante da suspeita de maus-tratos sofrido por
crianças. Antes veremos como as crianças passaram ao longo da
História da Humanidade.
Em
algumas
épocas,
houve legitimação e até legalização dos maus tratos infantis. Na
civilização hebraica do século
XIII a.C. havia
uma
lei que punia
filhos
considerados rebeldes, com penas severas
como apedrejamento,
de
acordo com a
decisão do conselho, que intervia quando os pais não conseguiam
cumprir os atos instruídos. No
império greco-romano, havia
o
infanticídio para
crianças
portadoras de deficiências ou, simplesmente, indesejadas e
indisciplinadas. Em
algumas tribos da América do Sul também havia infanticídio, como
costume, para
a
criança
que nascesse portadora de deficiência física. Além
da punição através de instrumentos jurídicos, várias religiões
e mitologias, subjugavam as crianças como seres inferiores e há
relatos de violências contra elas: o Gênesis do judaísmo mostra
que Abraão
quase sacrificou o
próprio filho;
na mitologia grega, Crono, pai de Zeus, matou seus cinco primeiros
filhos; no México, índios
ofereciam
a vida de crianças aos deuses em troca de uma boa colheita. O
teólogo
Santo Agostinho propagava
que as crianças eram
um símbolo da força do mal. Na
era moderna, os castigos corporais contra as crianças eram
permitidos até pouco tempo em todo o mundo. Com uma votação
acirrada no Congresso londrino, tal
prática só foi abolida em 1985 e,
nos EUA,
até
a
década de sessenta do
século XX,
as crianças negras apanhavam
constantemente.
Embora
hoje tudo isso sejam coisas do passado abandonadas por força de
leis, muitas pessoas ainda espancam e dizem que assim fizeram para
educá-las. Quem for pego cometendo esse crime responderá à
Justiça.
Formas
de constatação
O
primeiro registro
de que houve consequências
a quem
maltratou criança ocorreu em Nova
Iorque (EUA) em 1874, com o caso da
menina Mary
Ellen Wilson que
fora abandonada
pela mãe e depois perdeu o pai na Guerra Civil. Ela
acabou por ficar aos cuidados
da madrasta e seu
cônjuge que espancavam.
Foi
o médico forense francês Ambroise Auguste Tardieu quem registrou
pela primeira vez, em 1860, a expressão “criança
espancada”, em
um
trabalho
a
partir do estudo de dezoito óbitos infantis cujas lesões
(queimaduras, fraturas e equimoses sendo as mais frequentes) não
correspondiam à história coletada no atendimento. E
a Síndrome
da Criança Espancada
foi reconhecida pela Academia Americana de Pediatria em 1962, quando
mencionada em um trabalho dos médicos Henry Kempe e F. Silvermann.
Foram
observados ferimentos
graves de épocas diferentes em
crianças de pouca idade,
com explicações inadequadas dadas pelos responsáveis e com
diagnóstico baseado em achados clínicos e radiológicos.
No
Brasil, quando
o
primeiro caso de espancamento infantil foi descrito em 1973 por um
professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São
Paulo, as
autoridades começaram a se procupar em preteger as crianças e foi
criado o
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, um
código responsável
por proteção integral e
assegurar direitos à
população infantojuvenil.
Conclusão
Segundo
a pesquisadora Laura Luise: “Cerca
de 50% das crianças que voltam para casa voltam a ser espancadas e
20% delas acabam morrendo”. Diante de casos suspeitos e/ou de
confirmação de maus tratos contra crianças e adolescentes onde
forem atendidos, tanto em sistema público quanto em particular,
deve-se comunicara aos órgãos competentes: ao Conselho Tutelar, à
Delegacia de Polícia e ao Ministério Público (Promotoria de
Justiça da Infância e Juventude). O ECA
estabelece a notificação compulsória por parte dos profissionais
de saúde. O descumprimento desse dever configura infração prevista
no Artigo 245 do Estatuto:
Art.
245 – Deixar o médico, professor ou responsável por
estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental,
pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos
de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de
maus-tratos contra criança ou adolescente. Pena: multa de três a
vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de
reincidência.
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